O fim de um ano chega como um verdadeiro respiro e um lembrete de que devemos sonhar e renovar os nossos desejos para o próximo ciclo. Sonhar é como um combustível para que a gente continue acreditando que a vida pode nos trazer coisas boas. Mas para quem vive nas periferias, ter essa perspectiva se torna mais difícil quando existem outras preocupações no caminho.
No Instituto C, nós trabalhamos em conjunto para que famílias periféricas possam continuar sonhando e também realizar esses desejos. É importante que elas não apenas sobrevivam em meio a correria do dia a dia, mas também consigam idealizar e conquistar o que querem, e com conhecimento sobre direitos e direcionamento, esse caminho fica menos tortuoso.
Mais acessibilidade, oportunidade de estudar e conquistar bens próprios fazem parte dos sonhos de muitas famílias. Pensando nisso e pela perspectiva de moradoras da periferia de São Paulo, a Thais Gomes e a Nicolie Barbosa, estudantes de Design da PUC-SP, foram atrás de responder a pergunta “o que é sonhar na periferia?” e conversaram com mães e crianças atendidas no Polo Zona Norte do IC, que nos emocionaram com cada resposta.
Como moradoras da periferia, Thais e Nicolie sempre viveram a dualidade de resistir e sonhar em meio ao caos, por isso surgiu a ideia de trazer esse tema para o trabalho. “Nossa ideia de TCC surgiu de uma conversa que tivemos no ano passado, em que falamos sobre como éramos privilegiadas por poder sonhar mesmo diante da realidade em que crescemos, na periferia — e como muitas pessoas na mesma realidade não têm essa oportunidade”, conta Thais.
Para a Nicolie, estudante da PUC pelo Programa Universidade para Todos (PROUNI), essa foi uma forma de devolver a vontade de sonhar para quem mora em regiões periféricas. “Sempre digo que o lugar onde nasci, o Capão Redondo, é uma fábrica de sonhos. Somos uma juventude sonhadora que enxerga esperança além do nosso local de origem. Eu carrego essa esperança comigo, mesmo diante das adversidades que enfrentei até chegar a faculdade”, conta.
Como é sonhar com a mente em vários lugares?
Concretizar um sonho é um momento que deve ser celebrado, mas isso significa coisas diferentes para cada pessoa. Para muitas mães, o sonho tem o rosto dos filhos: mais segurança, educação, saúde e oportunidades que elas mesmas não tiveram. Mesmo nos momentos em que podem usar a imaginação de inúmeras formas, elas seguem pensando em sonhos que trariam bons momentos para todos ao seu redor. E para muitas crianças, o sonho é a janela por onde enxergam um mundo que vai além das ruas estreitas que conhecem.
Na periferia, sonhar não é apenas um exercício automático do dia a dia. É também uma construção feita aos pedaços: recortes de desejos e pequenas vitórias. Por isso, a atividade proposta pela Thais e pela Nicolie foi que as famílias fizessem colagens com imagens que representassem seus sonhos. Ali, a imaginação fluiu e surgiram recortes de viagens, carros, motos e até a cura de doenças que afligem suas vidas.
Diante de uma rotina pesada, esse imaginário é o que ajuda a sustentar a esperança e cria novas possibilidades. Embora não devesse ser dessa forma, ter um tempo para sonhar às vezes se torna um privilégio, e é isso que fortalece as famílias em diferentes frentes: ajuda a enxergar caminhos onde a vida real ainda não chegou, cria autoestima e coloca a pessoa no centro da própria história, e reconstrói o sentido de futuro, que geralmente é desgastado pela falta de oportunidades.
Estudar: um sonho das crianças e dos adultos

A rotina corrida de cuidado com os filhos faz com que muitas mães não consigam tempo para realizar os próprios sonhos. Quando questionadas, muitas delas falaram sobre a vontade de concluir os estudos e cursar uma graduação, assim como a Vilma, que contou que esse é um de seus sonhos: “eu tenho muita vontade de fazer uma faculdade, mas nunca tive um empurrãozinho. Pra mim, é o maior sonho da minha vida”.
No olhar das crianças, o sonho também se torna uma forma de pensar na mudança de vida para elas mesmas e para a família. Elas carregam em si a vontade de transformar a realidade a partir de uma profissão, e felizmente algumas delas já sabem o que faz seu coração bater mais forte: “salvar vidas. Ser médico”, esse é o sonho do Alan.
Direito de sonhar
Na infância, a imaginação vai para lugares dos mais diversos, é nesse momento que o mundo se torna um lugar de infinitas possibilidades. Mas quando limitações são colocadas, é como se uma barreira fosse construída entre aquela criança e tudo que ela ainda pode ser.
Assim como o Alan, muitas crianças sonham em seguir profissões que fazem seus olhos brilharem, mas atingir esses sonhos só é possível quando existem condições para realizá-los. Educação de qualidade e um espaço seguro para se desenvolver plenamente é direito de toda criança, e devemos lutar para que isso se concretize.
Os adultos também precisam desse combustível para continuar acreditando que seus desejos podem se tornar realidade. “Eu acho que sonhar nunca é tarde”, reforça Cristiane, mostrando que para sonhar não tem idade certa, e precisa somente das possibilidades e oportunidades para que se torne real.
Sonhos que inspiram
Thais, que vive próximo da Brasilândia, onde fica nosso polo da Zona Norte, conta que a troca com as mães e com as crianças foi muito rica para ampliar sua perspectiva sobre sonhar, essa ação que, por mais simples que seja, também muda realidades. “Para mim, foi uma experiência muito transformadora: poder escutar as histórias de outras pessoas, perceber como o sonho é algo simples e otimista no olhar das crianças, e como ele também permanece vivo nas mães”, reforça.
Já a Nicolie, reconhece que seus sonhos são o que movem também a esperança, e contar os sonhos de outras pessoas é uma forma de ver a realidade das periferias de diferentes perspectivas. “Foi emocionante ver como todos olhavam para cima quando falavam de sonhos e como seus olhos brilhavam durante as colagens. O vídeo final é só um pedacinho do que foi essa experiência. O maior impacto está no que o processo trouxe para nós e para quem participou dele”, lembra a estudante.
Para conhecer mais sobre o trabalho da Thais e da Nicole e entender como os sonhos podem ser uma ponte importante para quem vive na periferia, clique aqui e assista o vídeo completo com os depoimentos de algumas mães e crianças atendidas pelo IC.



