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Pedro Henrique, o menino que queria ser prefeito

Quem escuta a voz doce do Pedro Henrique (11) no áudio em que ele conta para sua mãe, o que ele faria como prefeito da maior cidade do país, deve ficar pensando de onde vem todas aquelas ideias. “Eu vou comprar milhares de hotéis para as pessoas morarem e para as pessoas que não conseguirem vaga, eu vou comprar vários e vários cobertores quentinhos”.

 

É que, Pedro Henrique, além de criativo como a maior parte das crianças na sua idade também tem um exemplo que vem de dentro de casa ou melhor, vem da trajetória de sua mãe, Juciara, nas ruas de São Paulo. Jully, como gosta de ser chamada, encontrou no movimento de ocupações da cidade sua luta para um mundo melhor e o resultado já ecoa nos desejos de seu filho. Mesmo tendo ficado quatro anos longe de sua mãe, Pedro sabe o valor e a importância desta relação de afeto para o seu crescimento. “Eu vou arrumar uma família boa, bonita, uma família ótima para as crianças que moram na rua, elas precisam de alimento, coração, uma mãe verdadeira, que ame, que aprenda a cuidar de um filho e de uma filha.”.

 

Pedro e seu irmão Matheus Henrique (15) participam do projeto Educação em Rede desde fevereiro deste ano quando Juciara procurava projetos voltados à Educação para auxiliar as crianças que vivem na Ocupação José Bonifácio, localizada na região da Sé, durante a pandemia. “Marcamos uma reunião para ver como poderíamos participar do projeto. Quando o Pedro viu o projeto, ele amou. Ele tinha um problema na escola, porque na escola existe pouca escuta.”.   

 

Além da escuta, o projeto Educação em Rede também era visto por Jully como uma forma de manter as crianças em um caminho de aprendizado, afinal de contas, ela entendeu na prática a importância do conhecimento para transformação da sua vida. “Fui até a Câmara Municipal pela primeira vez depois do despejo, nestes anos de luta, fui aprendendo muito coisa. Meu maior orgulho foi pisar dentro de uma ocupação, o movimento me ensina todo dia. Meu objetivo agora é entrar na Faculdade e cursar Serviço Social.”. 

 

Além de Pedro Henrique e Matheus Henrique, Jully morava com sua terceira filha, Anna Blyatriz e sua mãe no Jardim Brasil quando, em 2014, recebeu a ordem de despejo que mudaria a sua vida. “Guardo a ordem de despejo até hoje porque foi um momento de virada”. Sem ter para onde ir, ela se viu obrigada a colocar a mãe e os filhos dentro de um ônibus com destino ao Maranhão. “Minha mãe levou meus filhos para eles não ficarem na rua. Foi um baque muito grande ficar longe deles, mas eu não tinha nada, só a roupa do trabalho.” conta com a voz embargada. 

 

Depois de morar um tempo na rua, Jully conseguiu encontrar acolhimento em uma ocupação no centro da cidade. “Quando fui para a primeira Ocupação, fui entendendo um pouco mais do que era o movimento, fui vendo mulheres empoderadas, fui vendo aquelas mulheres, fui me engajando, me fortaleci.”. Após 6 meses, a Ocupação teve reintegração de posse e Jully viu sua vida começar do zero novamente. “Me fortaleci de novo. Quando eu achava que o mundo ia parar, essas mulheres me ajudaram, foi tudo uma proteção de rede.”. Foi neste processo que Jully se tornou uma das líderes do movimento e da ocupação José Bonifácio, na qual mora até hoje.

 

Estabilizada na nova ocupação e muito mais forte e empoderada, Jully conseguiu trazer seus filhos de volta para São Paulo em 2018, depois de quatro anos distantes. “Meus filhos e minha mãe sofreram muito no Maranhão. Meus filhos amadureceram com a vida. Depois de 1 mês que minha mãe voltou para São Paulo, ela faleceu. Parece que ela veio apenas se despedir da gente.”. 

 

Hoje, além de defensora assídua dos Direitos Humanos, Jully passou a participar de diversos movimentos sociais e é membra executiva do Fórum de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolecente e também participa do Conselho da Saúde. A energia e o incentivo não mudaram com as novas funções, nem mesmo com a pandemia, nem o trabalho como mãe, afinal de contas, ela, assim como Pedro Henrique, sabe da importância do contexto familiar. “Vou fazer de tudo para os meus filhos terem um estudo, o conhecimento é a base de tudo.”. Enquanto isso, Pedro continua sonhando com uma cidade e um país melhor para todo mundo. “Mãe, você não está bem? Mãe, eu te amo! Eu vou ser presidente do Brasil.”.

 

PAFRodas de Conversa

Rodas de Conversa | Expectativa x Realidade 2020

Em novembro, o PAF – Plano de Ação Familiar começou a tratar de um novo tema nas rodas de conversa: Expectativa x Realidade. A Psicóloga do projeto, Nayara Oliveira, conduziu o encontro com as famílias e iniciou a atividade com uma breve explicação sobre o tema escolhido. “Estamos chegando no fim do ano e como estamos fazendo rodízio entre as famílias, mês presencial, mês virtual, este é nosso último encontro. Por isso, lembramos daquela brincadeira da internet Expectativa x Realidade. Pensamos que seria interessante falar sobre as expectativas que tivemos no início do ano, sobre as realizações e sobre aquelas que não foram atendidas. Eu mesma fiz muitos planos no começo do ano e muitos não puderam ir para frente porque a realidade se mostrou diferente.”, explicou.    

 

As participantes, na sua maioria mulheres, puderam falar um pouco sobre os anseios que tomaram conta das suas vidas com o início da pandemia em março deste ano. “Quando começou a quarentena, eu quase surtei em casa. Comecei o ano cheia de expectativas, tenho 3 crianças e sou apenas uma mãe, de repente estávamos todos trancados em casa, elas com toda aquela energia dentro de casa. Teve dias de não saber se era segunda, terça, perdi a noção. Minha sensação é a de que não fizemos nada. Você só vê passando os dias.”, comentou Ivete Santos de Almeida, que participava pela primeira vez da roda.

 

Para Nayara, é comum que esta relação com o tempo seja alterada em um momento como este. “Nos sentimos um pouco perdidas, uma sensação de mesmice, somado a isso, tememos a morte e, ver isso muito próximo, em uma realidade mundial, também tem efeitos, nós sentimos medo do que pode acontecer.  Por isso, o ponto central aqui é se existe a possibilidade de deixar para trás esses medos, na esperança de alguma proteção, de que o ano que vem seja diferente, ou seja, uma vontade de ultrapassar este tempo”, comentou.

 

Edna Maria de Aquino, mãe da Ana Clara, que participa do PAF desde janeiro de 2020 concorda que o desejo é para que este ano acabe logo. “Estou tentando superar a cada dia, manter a paciência em casa. É o que tá tendo. A gente fica em pânico porque nossos filhos são do grupo de risco. A minha maior expectativa para o ano que vem é a vacina, somente quando tiver vacina, a gente conseguirá respirar novamente.”.

 

Na segunda parte da roda, as famílias sortearam um papel com o nome de outra pessoa presente na ocasião. A ideia era fazer um amigo secreto simbólico em que cada um escrevesse o que desejava ao outro para o próximo ano. O destaque ficou por conta da carta escrita pela Liliane para a Cristina, confira abaixo:

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“Bom dia Cristina, nesta carta começa aqui uma nova amizade. Quando você começou a falar vi em você uma mulher guerreira mas também uma pessoa bem alegre. 

 

Cristina, o que dizer desse ano né. Vivemos com medo sem expectativa mas graças a Deus estamos bem. Nossa família bem também. Agora vamos falando. 

 

Ano que vem que possamos nos encontrar com notícias boas para compartilharmos. 

 

Te desejo tudo de bom que não falte em sua vida e mesmo em sua casa a paz e alegria o amor saúde e pão de cada dia e que seus planos e projetos desse ano não deram certo que ano que vem se realize todos e os que você almeja de melhor venha se realizar.”

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Para Nayara, as rodas de conversa proporcionam um momento de troca importante, no qual as famílias deixam de se sentir solitárias, fortalecendo umas às outras. “Ás vezes, precisamos inventar outra estratégia, um outro jeito, porque a realidade se mostra diferente. E essa realidade se apresenta de forma muito dura, produzindo traumas, medos, perdas… muitas perdas e a dificuldade de não poder viver o ritual destas perdas. (…) E eu ouço isso de maneira simbólica, as vezes, pelo simples fato de não estar convivendo próximo dos seus, sentimos nossa batalha solitária, mas ouvir das famílias que, ainda que tudo isso esteja acontecendo, elas estão mantendo a esperança e um desejo de esperança que ajuda a encontrar forças. Acredito que isso nos fortalece de alguma forma.” finaliza.  

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Conquistas importantes para as famílias do Educação em Rede

Apesar da taxa de desemprego ter alcançado nível recorde, mães atendidas pelo Educação em Rede comemoraram a conquista de empregos no último mês. O trabalho, ou a falta dele, é uma das principais questões trazidas pelas famílias durante o atendimento com a Assistente Social, Vanessa Gonçalves. “Eu fico sempre atenta às vagas de emprego quando passo em algum lugar e vejo a placa de contratação já anoto tudo para passar para as famílias”, explica.

 

Por este motivo, Vanessa acaba participando ativamente destes processos, com orientações e encaminhamentos, como o que aconteceu com Ana Cláudia, Lucinete e a Claudiane que estavam cheias de expectativas com relação aos processos seletivos. “Sempre falo palavras positivas e de incentivo quando elas me dizem que estão indo para processo seletivo, conversamos sobre a importância de correr atrás e não deixar a ansiedade tomar conta de tudo. Juntas conseguimos alcançar bons resultados.”. Outra demanda importante apareceu durante atendimento da Patrícia, mãe de Naryelle, que precisava de cinco indicações para serviço como diarista, sem vínculo empregatício, em residências na região do ABC e encaminhou outras cinco famílias que participam do projeto. 

 

A questão em torno do desemprego e de ocupação em atividades formais sempre esteve presente na rotina dos atendimentos do projeto, porém, diante do momento vivido, em decorrência da pandemia, este cenário se agravou, alcançando 14,4%, a maior taxa de desempregados desde 2012,  segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), números certamente refletidos nas famílias atendidas. “A falta de renda tem sido a principal demanda trazida pelas famílias que estamos atendendo. Com a pandemia, muitas famílias perderam seus empregos e quem já estava desempregado, viu sua situação se agravar ainda mais, dificultando a reinserção no mercado de trabalho. Hoje posso dizer que a maior demanda dos atendimentos é a busca por empregos.”, comenta Vanessa.

 

Nestes casos, Vanessa encaminha as famílias para o Posto de Atendimento ao Trabalhador da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo (PAT), localizado na Rua Boa Vista e para o Centro de Apoio ao Trabalho e Empreendedorismo – Cate, na Avenida Rio Branco, ambos na região central de São Paulo. Sensível ao problema, ela passou a ficar ainda mais atenta a possíveis vagas de trabalho com o perfil destas famílias. “A todo instante eu faço a busca e seleção de vagas que atenda aos perfis profissionais das famílias, depois repasso esses dados para os interessados. Além dos responsáveis que buscam ativamente por essas oportunidades, também compartilho essas informações com as demais famílias por meio do grupo do WhatsApp. Repasso o link de grupo de empregos, o qual faço parte, para que possam ser adicionados, possibilitando o acompanhamento das vagas disponíveis.”.

 

“Estas conquistas são sempre muito importantes, não somente para as mães, mas para nós todas do projeto e o Instituto como um todo.”, finaliza Vanessa.

Gestão de Pessoas

Artigo |ONGs e empresas são mais semelhantes do que imaginam

Quando encerrei minha carreira executiva há dois anos, tracei uma meta de dedicar 25% do meu tempo a ações sociais e de impacto positivo. Foi então que conheci o Instituto C. A proposta de ajudar crianças e famílias vulneráveis me sensibilizou desde o primeiro instante.

 

Meu objetivo foi trazer a experiência acumulada no mercado corporativo para ajudar na gestão do instituto. Tenho feito isso há dois anos e estou muito feliz porque vejo os resultados aparecerem e, desta forma, temos conseguido ajudar muitas pessoas.

 

Ao fazer uma reflexão sobre minha trajetória profissional, vejo muitas similaridades entre a gestão de uma ONG como o Instituto C e de uma empresa. Gestão se aplica a qualquer tipo de negócio, seja ele pequeno, médio, grande, startups ou ONGs. Todas essas organizações têm a necessidade de administrar recursos, por meio de pessoas, para atingir determinados resultados.

 

Para isso, precisamos aplicar bem os recursos financeiros, atrair profissionais alinhados com os valores e propósito da organização e estimular o trabalho em equipe e a motivação das pessoas. O ser humano não difere muito nas suas aspirações e necessidades profissionais, mesmo em organizações distintas. Pessoas precisam de apoio, feedback, treinamento, querem crescer e se realizar na sua profissão, usando seu potencial e sua criatividade. Tudo isso, nós, como líderes, precisamos proporcionar às pessoas, além de respeitá-las e dar oportunidades de desenvolvimento.

 

Tão importante quanto a gestão de pessoas é a gestão de processos, imprescindível para o êxito de qualquer tipo de organização, inclusive as ONGs. Com relação a este aspecto, menciono a necessidade de planejamento, de ter metas bem definidas e projetos inovadores.

 

Mesmo com todas as semelhanças, pude notar, nestes dois anos, duas diferenças significativas entre a gestão de uma ONG e de uma empresa. A primeira delas é que uma ONG já nasce com o propósito de impactar positivamente a sociedade e, justamente por isso, precisa comunicá-lo de maneira intensa, pois o propósito de ajudar toca o coração das pessoas e atrai muitos talentos. Em uma empresa privada isso é mais difícil, pois há necessidade de gerar lucro para os acionistas. Mas já existe um movimento na sociedade para que as empresas atendam às necessidades de todos os stakeholders, incluindo a sociedade e o meio ambiente.

 

A outra diferença é que uma ONG não visa o lucro. Ao contrário de uma empresa privada que precisa ser rentável para atrair investidores, uma ONG é mensurada pelo impacto que causa com seu propósito. Mas isso traz um grande desafio que é a busca de recursos financeiros para sustentar a ONG, o que demanda da liderança uma habilidade diferenciada para divulgar os projetos, atraindo pessoas e outras organizações dispostas a apoiar com recursos financeiros.

 

Tanto empresas privadas como ONGs cumprem papeis importantes na sociedade e possuem desafios que demandam gestão e lideranças preparadas para garantir sua perenidade no longo prazo. Eu parabenizo o Instituto C por seu propósito e resultados. Fico muito feliz e orgulhoso de poder ajudar com minha experiência executiva no Conselho Consultivo e também com mentoria para as lideranças do instituto. Vida longa ao IC!

 

Francisco Deppermann Fortes