Estudantes de psicologia promovem atividade sobre defensoria pública com as crianças
Somos estagiários de psicologia e estamos desde o início do ano acompanhando a equipe do Instituto C e pensando, de forma conjunta, ações dentro da brinquedoteca. Uma destas ações era expandir os temas e reflexões vividos nas rodas de conversas com as mães e responsáveis. O espaço de fala e troca também poderia acontecer lá, com atividades e vivências.
Em outubro, o tema discutido foi “Defensoria Pública”. Convidamos as famílias a trazerem suas crianças e, no primeiro dia vieram cinco, entre 6 e 10 anos. Para começar, fizemos uma roda em pé e nos apresentamos falando nossos nomes junto com um gesto. Todos repetiam, como um cumprimento. Dessa forma o grupo todo pareceu se integrar, dizendo seu nome e do outro, reconhecendo ali seu espaço e abrindo espaço para o outro também estar.
¨Naquele momento, não caberia definir o certo e errado, mas sim viver um exercício de reflexão crítica em que todos pudessem caber e somar. As crianças sortearam, ao todo, 5 palavras: dever, cidadão, direito, ajuda e grupo.”
Para aquela ação, preparamos previamente um baralho de palavras que possuíam ligação com o tema (Defensoria Pública) e imagens diversas. Sentamos em roda, espalhamos as imagens no chão e pedimos para uma das crianças sortear uma palavra. O espaço ali era para criarmos sentidos e significados em conjunto a partir da conversa sobre as palavras e a associação com as imagens, e atravessamentos com suas vivências e repertórios. Naquele momento, não caberia definir o certo e errado, mas sim viver um exercício de reflexão crítica em que todos pudessem caber e somar. As crianças sortearam, ao todo, 5 palavras: dever, cidadão, direito, ajuda e grupo.
A palavra dever, segundo as crianças, significava algo que precisaria ser feito. Através das imagens, explicavam que era dever do adulto não brigar com a criança, assim como era dever do adulto levá-las para passear. Uma imagem de tintas e cores representava o dever da criança de ter e fazer artes, e a imagem de pessoas abraçadas significava o dever de todos de receber e dar carinho.
Já com a palavra cidadão, as crianças disseram que era uma pessoa. Fomos perguntando e provocando para entender melhor quem seria essa pessoa.
- ‘Todos podem ser cidadãos, tooooodos mesmo?’, indagamos;
- ‘Sim, mas quem machuca e agride o outro não pode mais ser cidadão’, respondeu uma das crianças. ‘Mas, claro que se a gente perdoasse ele, poderia então voltar a ser cidadão’;
Esse momento gerou uma pausa de reflexão no pequeno grupo. Escolheram então imagens de um grafite em que havia um indígena com cabelos de árvore, outra imagem de olhos, outra de pessoas conversando e uma quarta imagem de pessoas com deficiência.
Interessante perceber como é a concepção das crianças em relação aos conceitos escolhidos por palavras. Traziam os conceitos para o concreto, para o dia a dia, em forma de exemplos e lembranças. Nessa troca, nós não éramos os protagonistas. Nessas semelhanças e diferenças de vivências, as crianças se reconheciam, ajudavam-se e questionavam-se nas falas umas das outras. Isso fez com que a reflexão fluísse de uma maneira mais aprofundada.
Vale lembrar que escolhemos imagens inclusivas, com pessoas com deficiências exercendo atividades diversas, o que percebemos que fez muita parte das escolhas das crianças. Isso nos faz pensar sobre como elas reconhecem aquelas diferentes pessoas em suas rotinas, e como a inclusão faz parte da vivência delas. No chão, ia surgindo um desenho entre imagens e palavras, um mapa de toda aquela discussão.
Em seguida, sortearam a palavra direito. As imagens escolhidas representavam diversas formas de se olhar essa palavra:
- ‘Essas casas estão desenhadas direito’, trazendo o sentido de ordem, retas, alinhadas;
- ‘Nessa rua tem dois lados, o direito e o esquerdo’, sendo aqui um lado;
- ‘A vacina precisa ser dada direito para não doer’, ‘precisa atravessar a rua direito’, ou seja, de maneira correta, jeito certo.
Perguntamos então, sendo direito igual a certo, o que seria certo para as crianças. É direito da criança o que? Como se fosse uma voz só, todas disseram: “Brincar”. Histórias de casa e de família foram surgindo. E, antes de perguntarmos, já começavam a compartilhar: havia o direito a comida, a casa, e também a poder andar de cadeira de roda.
- ‘A pessoa tem direito de andar de cadeira de rodas?’, perguntamos;
- ‘Sim;’
- ‘Mas, e se eu construo uma rua em que você não consegue passar com a sua cadeira. Eu tô atrapalhando o seu direito?’
- ‘Acho que não;’
Mas, neste momento sua amiga questionou:
- ‘Ai amiga, você já não consegue nem andar, já está de cadeira de rodas e aí você não consegue passar na rua? Não pode atrapalhar a cadeira de rodas. É direito;
Montamos novamente um mural no chão.
Então sortearam a palavra ajuda. As crianças separaram imagens. Compartilhavam que era importante ajudar quem precisa andar com a cadeira de rodas, e também ajudar as pessoas que estavam tristes a se sentirem melhor. Ajudar era cuidar.
- ‘Como poderíamos fazer isso?’;
Foram dando exemplos de piadas, falas e acolhimentos que usavam no dia a dia para ajudar as pessoas se sentirem felizes e melhores.
Por fim, sorteamos a palavra grupo. A reflexão foi sobre como poderia ser um conjunto de pessoas, que se conheciam ou não. Seus integrantes poderiam ser diferentes. Este grupo poderia ter animais. Além disso, “a família também poderia ser um grupo”.
Percebemos que, aos poucos, as palavras sorteadas passaram a se misturar, e aquele mapa no chão, cada vez maior, não criava divisões, mas sim um emaranhado de sentidos que conversavam e se complementavam.
Olhamos juntos aos mapas mentais, admirando o tamanho de nossa conversa, satisfeitos com aquela reflexão tão concreta ali ao nosso lado. O convite, por fim, era de sermos multiplicadores desses conhecimentos. Através de uma colagem – com revistas e cartolinas – escolherem palavras que tenham lhes atravessado e organizar seus próprios mapas mentais. As palavras escolhidas foram ajuda e grupo.
Aquele momento não era de esgotar a discussão, mas sim deixar a porta aberta e escancarada para que esses temas pudessem se esparramar, transbordar e reverberar no grupo, nos seus espaços, amigos e familiares!
* Texto escrito por Zoé Coin e Rafael Martinelli, estagiários do 10º e 9º semestre de psicologia da Universidade UNIP – Universidade Paulista.
Saiba mais sobre defensoria pública.