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Nutricionistas ajudam a tratar a seletividade alimentar em crianças com autismo

A seletividade alimentar é uma condição caracterizada pela aversão a uma grande quantidade de alimentos. É uma sintomatologia muito comum em pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), como mostra um estudo realizado pela Universidade de Marília, em São Paulo. Isso porque envolve uma questão sensorial, que é algo muito presente no espectro. Pessoas com autismo podem ter um padrão alimentar mais rígido, ou seja, comem sempre os mesmos alimentos, por isso a quebra na rotina com a inserção de novos grupos alimentares leva ao desconforto e rejeição.

Para as famílias que têm crianças com autismo, a seletividade é um desafio enfrentado diariamente, uma vez que elas preferem somente um tipo de alimento específico, e nem sempre são os mais saudáveis. Conversamos com a nutricionista Profa. Dra. Rosana Farah, especialista em transtornos alimentares, que falou um pouco mais sobre essa questão. “Para os autistas, o ideal seria que as coisas fossem sempre iguais, com a mesma forma e apresentação. Desta maneira, os alimentos “embalados” podem ser os preferidos, pois terão o mesmo cheiro, cor, textura e crocância”, pontua.

A nutricionista explica que o grau de seletividade e aversão alimentar pode ser desencadeado por atitudes comportamentais como: hipersensibilidade, experiências anteriores de engasgos, refluxo, alergias, além de questões nutricionais como deficiências de nutrientes, distúrbios gastrointestinais que agravam a falta de apetite.

O maior desafio, então, é entender como lidar com a seletividade da melhor forma possível, sem que a criança se sinta na obrigação de mudar os hábitos, mas de forma que a alimentação diversificada faça parte, aos poucos, da sua rotina. Nesse contexto, é essencial um trabalho multidisciplinar com nutricionista, médico, fonoaudiólogo e terapeuta ocupacional, que consigam quebrar as barreiras e acolher tanto a criança quanto a família.

A nutrição como pilar fundamental do tratamento

O papel dos nutricionistas nesse contexto de tratar a seletividade é muito importante para uma reeducação alimentar e a inserção de alimentos saudáveis na dieta da criança ou do adolescente. Quanto mais a criança restringir a variedade de grupos de alimentos, aumentam as chances de repercussões clínicas, que podem resultar em deficiências nutricionais, como sobrepeso e obesidade. Além disso, sem o tratamento adequado, podem acontecer diversos prejuízos nutricionais como a falta de vitaminas e minerais, além da perda dos dentes e problemas intestinais.

O processo de avaliação feito pelo nutricionista deve ser personalizado de acordo com as especificidades de cada caso. De acordo com a especialista, uma avaliação nunca é única, e ela deve ser construída a partir de uma relação de confiança com a criança e seus familiares ou cuidadores. Além da análise de peso e altura, no início da abordagem também é preciso entender como funcionam as dinâmicas familiares e a relação da criança com os alimentos.

A Profa. Rosana destaca a importância de compreender o padrão dos alimentos que a criança aceita e quais características em comum como cor, consistência e textura existem entre eles. A partir disso, é possível começar a incluir novos alimentos de forma gradativa, de acordo com o ritmo da criança.

Uma das abordagens é utilizar técnicas de encadeamento alimentar, que se baseia nos alimentos que a criança gosta, para assim apresentar novas opções que sejam parecidas com eles, seja na cor, textura ou grupo alimentar. Um exemplo dessa abordagem é substituir os alimentos industrializados, como por exemplo batata frita por  a batata frita caseira.

O papel da família no processo de reeducação alimentar

A família tem um papel fundamental na construção da diversidade alimentar da criança, pois participa diariamente do momento das refeições e, por isso, deve tentar ressignificar estes momentos trazendo tranquilidade para que as crianças se sintam confortáveis e instigadas a experimentar novos sabores.

A especialista ressalta que “a família deve ser tratada, pois o estresse e o cansaço emocional, assim como a culpa e as cobranças são muito frequentes. É preciso orientar e ajudar as famílias a adquirirem um novo hábito para acabar com ciclos viciosos”.

O trabalho do IC na educação nutricional

Por isso, o suporte oferecido por organizações como o Instituto C é primordial para que a família dê o primeiro passo em direção à resolução desse problema. Aqui, nossas técnicas da área atuam dentro da nutrição social, com atendimentos clínicos pontuais somente em situações extremas. O nosso foco é na educação nutricional, com orientações para que as famílias consigam lidar da melhor forma com a seletividade. 

A seletividade alimentar é a maior demanda trazida para a nutrição entre as mães com crianças dentro do TEA, é o que conta a Raquel Kanup, nutricionista do Instituto C.

Raquel explica que a seletividade alimentar deve ser tratada também em um trabalho conjunto por meio de políticas públicas de promoção à saúde. E é nesse sentido que o instituto atua como um intermediador. “Se a família residir em São Paulo, e a criança com seletividade também tiver o diagnóstico de TEA, oriento sobre a possibilidade de solicitar à nutricionista da UBS o encaminhamento para o serviço especializado no tratamento da seletividade alimentar dentro do TEA (o Instituto PENSI)”, diz.

Além disso, segundo a nutricionista, quando há seletividade, algumas crianças não conseguem permanecer o período completo na escola por não se alimentarem na instituição. Nesses casos, quando ela não tem acesso ao tratamento adequado e, por isso, não tem a alimentação escolar adaptada, a nutricionista marca um atendimento com a família para realização de um relatório com pedido de adequação da alimentação, que deve ser encaminhado para a escola ou para o setor de alimentação escolar do município, para uma adaptação na alimentação.

Tratar a seletividade alimentar com um acompanhamento multidisciplinar é o que aumentam as chances das crianças passarem por esse processo de introdução de novos alimentos de uma forma mais tranquila e adequada. Dessa forma, queremos ajudar ainda mais famílias atendidas a superar a seletividade alimentar, já que boa parte delas tem crianças com autismo. 

Para isso, buscamos nutricionistas voluntários para se juntar a nossa equipe e atuar conosco tratando essa questão que é tão presente no nosso dia a dia de trabalho. Esse profissional estará com a gente em um trabalho que vai contribuir para mudar a realidade de muitas crianças. Clique aqui para saber mais!

**Esse artigo foi construído com o apoio de Raquel Kanup, nutricionista do Instituto C e Rosana Farah, professora, doutora e especialista em transtornos alimentares.